DIÁRIO DE UM EX-EXFUMANTE
Jorge Trindade
Hoje é meu Dia 1 de ex-fumante. Tá difícil pra caramba. Resolvi criar um blog (www,fumentefede.blogspot.com.br)porque não tenho com quem desabafar. Sei que o cigarro mata e empobrece. Mas faz pouco que constatei que o fumante fede. Já cansei de anunciar a minha chegada pelo fedor. Não é preciso olhar pra trás pra saber quem está chegando. Pela catinga é o Jorge.
Ontem sofri mais o efeito físico e psíquico da falta do tabaco. Toda hora saia do PC e ia até o fumador na rua. Deixei lá uma laranja com um furinho. Quando chegava e não achava o maldito, dava uma chupada na laranja. Foram umas 4 laranjas durante o dia, 3 pacotes de amendoim, e umas balinhas. Dá nada, troco o pneumologista pelo dentista.
Hoje parece que a inquietação é mais química. O spyware que a PM Company implantou na minha nuca pede comida a todo o momento. Estou tomando uma cachaça com butiá pra ver se o bicho sossega um pouco.
Hoje parece que a inquietação é mais química. O spyware que a PM Company implantou na minha nuca pede comida a todo o momento. Estou tomando uma cachaça com butiá pra ver se o bicho sossega um pouco.
Mário Quintana disse: "Desconfie dos que não fumam. Estes não têm sentimento, não têm vida interior. O cigarro é uma maneira disfarçada de suspirar". Já estou com saudade e hoje é recém o dia 3. O que me consola é que o Mário Quintana morreu abandonado e tossindo num quarto de hotel de terceira categoria no centro de POA. Nem filhos, nem netos, nem bisnetos, nem leitores. Ninguém quer cuidar de um fumante fedorento. O fumante demora a admitir que fede. Tentei conjugar o verbo feder no presente do indicativo e não deu certo. Só os outros que fedem! Podemos até feder em conjunto. Eu sozinho "não fedo".
Hoje é o Dia 4 sem cigarro e sem recaída até o momento. Achei que só chegaria neste ponto se tivesse ajuda médica. Mas estou conseguindo, "no peito". O pior do tabagismo é a discriminação. Li no blog de uma jornalista que ela tem vontade de dar um tapa na boca de quem fuma. Acho que se ela vê alguém com Mal de Parkinson tem vontade de dar tapas nas mãozinhas do coitado pra ver se elas param de tremer. E se ela vê um rengo deve ter vontade de dar uma rasteira, na perna boa. O Danilo Gentili do CQC explicou como é que se faz com aquele que reclama da fumaça do cigarro. A gente explica que ele é um fumante passivo e descreve como ocorre o processo. Algo sai do sujeito ativo e vai penetrando nas entranhas do passivo, que a princípio não percebe, mas quando quer reagir, não dá mais tempo. É como um "Estupro Gasoso".
Hoje é o quinto dia sem tabaco. O tamagoshi pede comida em horas impróprias e imprevisíveis. Ontem tive que dar dois peguinhas. Não vou considerar uma recaída porque provoquei as adversidades, como fazer churrasco, tomar cerveja e jogar cartas. Hoje vou sair de casa para trabalhar sem levar cigarro ou isqueiro. Claro, que posso comprar em qualquer boteco, mas fazia 35 anos que isso não acontecia. Tenho refletido mais é sobre a discriminação. Quem não fuma não gosta de fumante. O fumante só fuma porque conta com a... depois eu termino este raciocínio.
Complementando o raciocínio de ontem. Vou chamar não-fumantes de sóbrios e fumantes de ébrios. Sóbrios não gostam de ébrios porque ébrios fedem. Mas sóbrios gostam do dinheiro de ébrios, apesar do fedor deles. Em todo o lugar é proibido fumar, no comércio, repartições, ônibus, restaurantes, igreja, etc. Mas muitos vivem do dinheiro do fumo. Para que o fumeiro tenha dinheiro, alguém tem que fumar. Nunca vi um comerciante sóbrio dizer que não quer o dinheiro do fumeiro porque é resultante da produção do fumo. Mas tem nojo do ébrio. Eu, enquanto ébrio, sempre sou cumprimentado na cidade, mas nunca sou convidado para nada, porque ébrios fedem. Com exceção do único amigo que tenho, sóbrio, e que acha que, apesar de meu fedor, tenho algo para contribuir para consolidar esta amizade. Este sempre me convidou, com fedor e tudo. É um amigaço! Ah, tenho outro amigo, este é ébrio e estamos construindo uma amizade. Fedemos juntos.
Na condição de novo sóbrio (ébrio em recuperação), digo que pretendo não feder mais. Mas se agora me convidarem, porque não fedo, não adianta, não vou, por que "a burguesia também fede" (Cazuza).
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Armazém de Notícias - Edição 259 - Maio/2012 - Pág. 3
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