domingo, 2 de dezembro de 2012

DOS CANAVIAIS AOS ARROZAIS

Jorge Trindade

     A participação nesta campanha política foi muito enriquecedora quanto à minha formação pessoal. Às vezes não percebemos que vivemos em um mundo e a maioria da população vive em outro. Este choque com a realidade é que provoca o crescimento.
     Certo dia eu estava no Diretório do PT, quando entrou um cidadão e fez um depoimento que me deixou arrasado e revoltado ao mesmo tempo. Disse que havia trabalhado em uma propriedade rural e que ganhava "salário", mas que dele eram descontados aluguel, luz, água e alimentação, e que no fim do mês restavam 100 a 150 pilas e que tinha uma folga por mês durante a safra e neste dia vinha até a cidade para entregar os minguados para a família, que dependia dele. No final da safra fora mandado embora sem receber mais nada. Orientei-o a procurar o Sindicato dos Trabalhadores Rurais e lá explicasse a situação, pois não domino a legislação trabalhista quanto a trabalho temporário.
     Contou também, que alguns trabalhadores vão com a família, e aí todos trabalham, mas os descontos são os mesmos, inclusive crianças tem que trabalhar para pagar seu sustento. Este foi o motivo da revolta. Arrasado fiquei porque pensei que esta situação só ocorria nos canaviais do Nordeste.
     Posteriormente, quando fomos questionados pelos conselheiros dos Conselhos Municipais da área social, relatei este fato, que estaria ocorrendo trabalho análogo ao escravo na zona rural de Tapes. Não sei se estas entidades fizeram bom uso das informações, até por que não eram muito precisas. Não lembro o nome do produtor nem a região. Mas acho que Secretaria de Assistência Social, Trabalho e Cidadania poderia estabelecer uma parceria com a Delegacia Regional do Trabalho e fazer um mutirão para fiscalizar propriedades rurais durante a safra para verificar se esta situação é comum ou esporádica.
     A Proposta de Emenda Constitucional 57A/1999 (pasmem, é de 99) prevê o confisco da propriedade rural ou urbana onde seja verificada a existência de trabalho escravo. Mas tem encontrado grande dificuldade para tramitar no Congresso. O corporativismo da bancada ruralista faz forte resistência à PEC que foi aprovada na Câmara em 2012 e voltou ao Senado para ali dormir mais um pouco. O trabalho escravo está tipificado no artigo 149 do Código Penal como crime. E tudo isso está acontecendo diante de nossos olhos. Dos canaviais aos arrozais.
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A Notícia - Edição 12 - Novembro/2012 - Pág 2

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